
INTRODUÇÃO
A tecnologia, em todas as áreas, evolui. O smartphone que você tem em mãos é, certamente, muito mais avançado que os antigos “tijolões” do início do século. Como você bem sabe, é praticamente impossível trabalhar no mundo moderno sem acompanhar a evolução tecnológica, o que atualmente faz com que uma pessoa sem smartphone com acesso às redes sociais esteja, para todos os fins práticos, fora do mercado.
Da mesma forma, as tecnologias usadas pelos exércitos mundo afora também evoluem, e quem não acompanha a evolução não vai conseguir sobreviver no campo de batalha.
Ao longo da História da guerra, há uma eterna “disputa entre espada e escudo”, ou seja, de sistemas ofensivos e defensivos, com cada um tentando vencer a disputa, e em certas épocas a vantagem está com o “escudo”, e em outras épocas com a “espada”.
Uma das áreas em que esta disputa ficou claramente demonstrada na Guerra Russo-Ucraniana é a da artilharia.
Obuseiros rebocados são fundamentais na guerra desde a Idade Média, mas avanços tecnológicos como o uso amplo de radares de contra-bateria e “drones” (ARP, aeronaves remotamente pilotadas), fazem com que os obuseiros rebocados estejam praticamente com os dias contados.
Falaremos detalhadamente sobre os radares de contra-bateria em um artigo futuro. De forma simplificada, tais radares detectam os obuses em voo e calculam, em questão de um ou dois minutos, o local de onde os disparos saíram. Com tais informações, sistemas aliados podem retornar fogo na posição logo a seguir. Ou seja, 3 a 5 minutos no mesmo lugar é mais do que suficiente para ser atingido por fogo de retorno.
Tais radares, com ou sem apoio de drones, fazem com que práticas consagradas, como o de manter os obuseiros no mesmo local por longos períodos de tempo, sejam suicídio nos dias de hoje. Entretanto, mesmo o melhor dos obuseiros rebocados, com a melhor das tripulações e caminhão para reboque, leva pelo menos entre 2 a 3 minutos para concluir cada etapa do ciclo parar – entrar em ação – sair de ação – mover. Ou seja, estamos falando em dezenas de minutos, ou mesmo horas, no mesmo lugar, tempo mais do que suficiente para ser atingido por fogo de retorno do inimigo.
Artilharia destruída na Ucrânia
OBUSEIROS AUTOPROPULSADOS
A solução para tais problemas é o SPH (obuseiro auto-propulsado, OAP). Os precursores dos SPH foram usados ainda na Idade Média, mas geralmente empregavam calibres menores, para lidar melhor com o recuo das armas. Foi na Segunda Guerra Mundial onde, de fato, os SPH passaram a usar o mesmo calibre dos obuseiros rebocados principais, prática esta que ganhou bastante força durante a Guerra Fria, e hoje praticamente todos os exércitos modernos usam sistemas SPH.
Da mesma forma como acontece com veículos de outras categorias, há um grande debate sobre qual é a melhor forma de se locomover no campo de batalha, sobre rodas ou sobre lagartas (ou esteiras).
De modo geral, a propulsão sobre lagartas garante melhor mobilidade tática, especialmente em terreno difícil, como pântanos e lamaçais.
Entretanto, como as lagartas não se dão bem com estradas, veículos sobre lagartas geralmente precisam ser levados por carretas quando é necessário se deslocar ao longo de estradas por centenas de quilômetros.
Já a propulsão sobre rodas garante uma melhor mobilidade estratégica, pois tais veículos podem se mover em estradas de forma bastante semelhante aos caminhões civis – aliás, muitos dos veículos militares sobre rodas são baseados em tais veículos. A desvantagem é uma mobilidade tática reduzida, exceto se houver uma boa rede de estradas, ainda que de terra, na região de operações.

SPH NO BRASIL
O EB (Exército Brasileiro) tem obuseiros em dois calibres principais: 105 mm e 155 mm, ambos em padrão OTAN. O EB utiliza, há décadas, sistemas SPH sobre lagartas, com o sistema atual sendo o M109 americano, em calibre 155 mm, e antes dele usou bastante o M108, também americano, em calibre 105 mm.
Entretanto, o EB ainda não utiliza nenhum SPH sobre rodas. Para cobrir tal lacuna, lançou o Pjt VBC OAP 155 mm SR (Projeto Viatura Blindada de Combate Obuseiro Autopropulsado 155 mm Sobre Rodas), cujo objetivo é adquirir um moderno SPH sobre rodas, que empregue um obuseiro em calibre 155 mm. Os finalistas já foram definidos:
- Elbit ATMOS (Israel)
- Nexter CAESAR (França)
- Norinco SH-15 (China)
Trataremos do ATMOS e do CAESAR em outros artigos. Neste artigo, falaremos sobre o SH-15 chinês.



NORINCO PCL-181 / SH-15
Ao final da Segunda Guerra Mundial, a China se encontrava em uma guerra civil, que culminou na criação da PRC (República Popular da China) e ROC (República da China), mais conhecidas, respectivamente, pelos nomes China comunista e Taiwan. O exército chinês é o PLA (Exército de Libertação Popular).
A PRC, inicialmente, adquiriu equipamentos da URSS, e aos poucos passou a fabricar alguns deles sob licença. Entretanto, as relações sino-soviéticas passaram por uma ruptura ao longo das décadas de 1960 e 1970, levando a China a proceder a práticas como engenharia reversa, ou seja, fazer cópias não autorizadas de armas soviéticas (ou até de outros países).
A China, assim como a URSS, utilizam obuseiros nos calibres padrão Pacto de Varsóvia, a saber, 122 mm e 152 mm, cujas características gerais são semelhantes aos calibres padrão OTAN. A principal diferença está nos propelentes – enquanto o 155 mm use pacotes de propelentes, o 152 mm utiliza munição semi-fixa, ou seja, obus e estojo com carga propelente são armazenados separadamente mas são unidos na hora do uso.
Um dos primeiros obuseiros que a China fez sob licença foi o D-20 soviético, que os chineses adotaram como PL-66. Ao longo dos anos, a PRC sentiu a necessidade de desenvolver um SPH sobre rodas para exportação, e no início do século 21 lançou o SH-1, inspirado no CAESAR francês.
Os resultados foram considerados satisfatórios o suficiente para interessar ao PLA, que solicitou à Norinco um sistema derivado, o PCL-181, em calibre 152 mm padrão soviético. Foi desenvolvida uma versão de exportação, o SH-15, que utiliza o calibre 155 mm padrão OTAN. O SH-15 já está em uso na China, Etiópia e Paquistão.
O SH-15 é capaz de entrar em posição, ou voltar a se mover, em menos de um minuto.Tal rapidez aumenta muito a capacidade de sobrevivência ao fogo de contra-bateria. Assim como o CAESAR, as cargas de propelente e os obuses são carregados manualmente, com sistemas automáticos empurrando-os na posição. Isto permite uma elevada cadência de fogo, de até 6 disparos por minuto. As dimensões do SH-15 fazem com que seja incompatível com o KC-390.
Assim como os demais concorrentes, o SH-15 conta com um sistema computadorizado para a direção do tiro, que posiciona automaticamente o cano em posição. É compatível com todas as munições padrão OTAN, e a China também faz obuses de tal padrão, inclusive os GP155 guiados por satélite. Seu alcance máximo, dependendo da munição utiizada, pode atingir os 50 km, e há diversas pesquisas no âmbito da OTAN para a introdução de munições de alcance ainda maior.

Principais características técnicas do SH-15:
- Armamento principal: obuseiro de 155 mm, 52 calibres
- Alcance máximo: 50 km
- Armamento secundário: metralhadora 12,7 mm
- Tripulação: 6
- Peso bruto – 22 a 25 ton
- Comprimento: 9,68 m
- Largura: 2,58 m
- Altura: 3,50 m
- Cadência de disparo – 4 a 6 disparos / min
- Velocidade máxima: 90 km/h
- Alcance: 600 km
CONCLUSÃO
Como podemos ver, o uso de SPH sobre rodas é uma tendência em exércitos modernos, e o EB, atento às inovações, decidiu, acertadamente, que também precisa de tais sistemas.
Pesa contra o SH-15 o fato de que o Brasil não tem o hábito de operar armas chinesas, embora, aparentemente, o sistema apresenta características bem interessantes, a custos vantajosos.
Ficamos na torcida para que o EB tome a melhor decisão, e que o sistema escolhido sirva com eficiência, em grandes números e por muitos anos!
Por Renato Marçal
[…] apontamos neste artigo, diversos países vêm trabalhando no desenvolvimento de SPH (obuseiros autopropulsados), […]