
Durante os anos 70 e 80, a indústria de defesa brasileira viveu sua “Era de Ouro”, quando diversos projetos desenvolvidos por nossa indústria, despontavam no mercado internacional de defesa, com grande destaque para as viaturas blindadas desenvolvidas pela extinta ENGESA.
Neste período de crescimento que a indústria nacional experimentou, o Exército Brasileiro, se tornou um importante parceiro da indústria, lançando importantes programas de desenvolvimento e aquisição para modernização das capacidades brasileiras. Foi neste período que o Exército Brasileiro estava buscando um substituto para os vetustos M-8 Greyhound para cumprir missões de reconhecimento, e foram realizados estudos para concepção de uma viatura 4×4 destinada a realizar esclarecimento e reconhecimento, tarefa a qual não seria bem atendida por jeeps devido a sua grande vulnerabilidade.

Vários estudos foram conduzidos pelos engenheiros do PqRMM/2 ( Parque Regional de Motomecanização da 2ª Região Militar de São Paulo), resultando na concepção do conceito de um blindado leve 4×4, denominado Auto Metralhadora, porém este projeto não vingou, pois o EB preferiu apostar na plataforma 6×6 ao invés de uma 4×4, o que resultou no desenvolvimento do EE-9 Cascavel pela ENGESA, que se tornou um dos mais bem sucedidos veículos blindados brasileiros, sendo adotado por diversos países.

O conceito 6×6 se tornou uma “tradição” no Exército Brasileiro, o qual até o presente é a base de nossa força blindada sobre rodas, não tendo adotado nenhuma viatura blindada 4×4 desta categoria até o presente momento, e não há perspectivas para tal no futuro, uma vez que o futuro VBC cav, será a viatura italiana Centauro II 8×8.

A Engesa marcou a história da indústria de defesa brasileira, e uma de suas marcas foi a busca pela vanguarda tecnológica em seu nicho, buscando se antecipar as necessidades do mercado e com isso atender a nichos específicos do mercado de veículos militares especiais e blindados, apresentando soluções inovadoras, com viaturas capazes e com custos atraentes, dentre estes destaques, resolvemos trazer aqui a história do EE-3 “Jararaca”, que surgiu a partir do conceito do Auto Metralhadora, mirando no mercado externo, uma vez que o Exército Brasileiro se focou nas viaturas 6×6 com o EE-9 “Cascavel”, outro fruto da Engesa.
O projeto inicial do EE-3 previa uma viatura blindada 4×4 para reconhecimento que apresentasse agilidade, sendo equipado com uma torreta giratória blindada dotada de uma metralhadora que poderia ser nos calibres 7,62mm ou 12,7mm para autodefesa, além de contar com conjunto de lançadores de granadas fumígenas, com 3 tripulantes, sendo comandante, motorista e artilheiro.
O desempenho da nova viatura blindada era excelente, possuindo um raio de ação de cerca de 700km, podendo atingir 100km/h, o consumo era baixo, seu tanque comportava 140 litros de diesel, outro ponto era a capacidade de transposição de obstáculos e o peso que ficava em torno de 5.800kg.
O conjunto mecânico era muito confiável, tendo recebido conjunto de motor e caixa produzidos no Brasil, composto por um motor OM-314A de 120 cv da Mercedes-Bens disposto na traseira e equipado com uma caixa de transmissão com cinco marchas Clark 240V, seu sistema de suspensão era do tipo eixo rígido, flutuante, com molas semi elípticas e amortecedores de dupla ação, equipado com caixa de direção hidráulica ZF 8058.
O EE-3 “Jararaca” teve a produção seriada de 63 viaturas que foram exportados para diversos países, e tais viaturas se encontram ainda em operação, inclusive participaram de missões da ONU como a MINUSTAH, onde o Uruguai enviou alguns de seus exemplares para realizar patrulhamento.

O conceito do EE-3 “Jararaca” após tantos anos, ainda é muito eficiente e atual, e poderia facilmente originar uma nova série da viatura com algumas atualizações e pequenas modificações. Apresentando uma silhueta baixa, grande manobrabilidade e mobilidade em terrenos diversos, o veículo ainda é uma ferramenta extremamente eficiente para realizar patrulhas em áreas urbanas e com limitações a viaturas blindadas de maior porte.
O EE-3 “Jararaca” com certeza é um bom exemplo da capacidade e visão da indústria brasileira de defesa das décadas de 70 e 80, onde hoje, o projeto ainda se mostra uma solução interessante, que se atualizado poderia se tornar uma importante ferramenta para as capacidades do Exército Brasileiro, podendo equipar as unidades de pronta resposta, inclusive sendo lançado por páraquedas no teatro de operações, atendendo á uma série de missões.
Alguns dos EE-3 “Jararaca” foram equipados com sistemas ATGM Milan, os cipriotas equiparam os seus EE-3 para atuar como caça-tanques, outros operadores substituíram a metralhadora por um canhão Rh202 de 20mm.
É muito importante para nós do BrasilDefesa lembrar ao nosso público, o potencial e tudo que nossa Base Industrial de Defesa já conquistou e perdeu até aqui. Hoje lutamos para recuperar nossa capacidade industrial de defesa. E nesta caminhada árdua, é de suma importância fomentar o debate e a reflexão de nossa sociedade sobre a necessidade de uma postura responsável de nossa nação como um todo, afim de que possamos não apenas superar a crise que se abate sobre o nosso país, mas valorizar o que nós temos e o que somos, e com esse pensamento esperamos um dia contar com mais seriedade política e responsabilidade econômica e estratégica.
Por Angelo Nicolaci